Há alguns personagens que leio desde criança e associo imediatamente a quadrinhos. Tintim, Mafalda, Superman, Mônica, Lucky Luke, Mulher-Maravilha... E, claro, Asterix. A criação máxima de René Goscinny (roteiro) e Albert Uderzo (arte) faz parte da minha vida. Quando eu era criança e minha família se mudou para Brasília, não tinha amigos no bairro novo. Isso não significa que eu não tivesse minhas turmas. Adorava a da Mônica e os Superamigos, por exemplo, mas o único momento em que eu me sentia mais velho (e, portanto, mais inteligente e maduro) era quando mexia na biblioteca dos meus pais para pegar emprestados os álbuns dos irredutíveis gauleses.
Asterix, Ideiafix, o incompreendido bardo Chatotorix, o hilário casal Abracurcix e Naftalina e, claro, aquele com quem eu mais me identificava: Obelix. Grandalhão, desengonçado, sem noção. As coisas aconteciam ao seu redor, e ele não percebia.
A turma do Asterix – os irredutíveis gauleses – é grande e bem definida. Do mesmo jeito que eu me identificava com o Obelix, havia muitos outros com os quais os leitores podiam criar uma empatia maior. Este é um dos ingredientes na poção mágica de Goscinny & Uderzo para o sucesso desta icônica HQ: os hilários, e bem construídos, personagens.
O elenco, claro, é só um dos ingredientes. As inteligentes e cativantes tramas boladas por Goscinny também têm importância: histórias complexas como a “Cizânia” ou “Asterix e Cleópatra” são cativantes do início ao fim – sem falar no infalíveis, e por vezes, infames trocadilhos.
Um terceiro ponto é a arte, linda, de Uderzo. Os personagens foram criados com um visual único, até hoje inconfundível, e as sequências de humor físico arrancavam gargalhadas dos leitores graças à sua maestrina na narrativa.
Há outros ingredientes, claro, mas fiquemos só neste por hoje. Estou relembrando de Asterix, Ideiafix, Obelix e companhia porque teremos dois lançamentos de peso nos próximos dois meses – mas que valem por quatro, como explicarei mais abaixo.
O primeiro é “Asterix e o Grifo”, uma história inédita dos irredutíveis gauleses. Trata-se do 39º livro do personagem, e o quinto e último produzido pela dupla Jean-Yves Ferri (roteiro) e Didier Conrad (arte). Os 24 primeiros álbuns dos gauleses foram da lavra dos seus criadores; com a morte de Goscinny, em 1977, Uderzo produziu sozinho os dez seguintes, até a publicação de “O Aniversário de Asterix e Obelix - O Livro de Ouro”, em 2009.
E foi em 2013 que, pela primeira vez, os gauleses ficaram com mãos outras que não a de seus “pais”: os já citados Ferri e Conrad assumiram a tarefa. Entre 2013 e 2021 eles publicaram cinco aventuras inéditas, todas elas já publicadas aqui no Brasil – todas, menos uma: a que faltava era justamente “Asterix e o Grifo”, que está em pré-venda agora em novembro e cuja venda começa para valer no mês que vem.
Uma sinopse bem resumida do enredo: para ajudar um povo amigo, Asterix, Obelix, Ideiafix e Panoramix partem em uma longa viagem em busca de uma criatura estranha e aterrorizante nas desconhecidas terras ao norte do Império Romano.
O outro lançamento, o que pode valer por três, dependendo do ponto de vista, é o primeiro tomo da coleção “Asterix Omnibus”. Já em pré-venda, mas com lançamento oficial em janeiro, o volume reúne nada menos do que as três primeiras aventuras do personagem, com Goscinny e Uderzo ainda começando a explorar – e a nos apresentar – esta incrível aldeia e seus maravilhosos moradores: “Asterix, o Gaulês”, “A Foice de Ouro” e “Asterix e os Godos”.
Esta nova coleção é uma grande oportunidade para quem não conhece o personagem – ou para quem, como meus pais, teve um filho que, quando criança, leu e releu tantas vezes seus exemplares do Asterix que as edições hoje talvez não se encontrem nas melhores condições...
Pedro Cirne é formado em jornalismo, desenhos e histórias em quadrinhos. É autor do romance “Venha me ver enquanto estou viva” e da graphic novel “Púrpura”, ilustrada por 17 artistas dos 8 países que falam português.
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