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Letícia Misna - DA AGÊNCIA CENARIUM

MANAUS (AM) – Em 355 anos, a história da cidade de Manaus é formada por uma parcela de imigrantes, seja de passagem ou de permanência, desde a sua fundação em 1669. No turismo, a capital do Amazonas é destino de muitos visitantes. Em janeiro deste ano, a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur) colocou a cidade como o terceiro destino de visitantes para o período. Os turistas vieram principalmente da Argentina, Estados Unidos, Portugal e Itália.

Quanto à permanência, mais de 94 mil refugiados e imigrantes de diferentes nacionalidades foram registrados pelo Sistema de Registro Nacional Migratório (Sismigra) em Manaus, entre os anos 2018 e 2024. Os dados são da Polícia Federal (PF), foram publicados pelo Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra) e processados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur/ONU). Os números, no entanto, não representa a totalidade de estrangeiros que vivem na cidade.

A CENARIUM reuniu depoimentos de três cidadãos de nacionalidades venezuelana, australiana e búlgara, todos atraídos por diversos motivos para Manaus. Moradores da capital amazonense, eles relataram o amor pela região, as dificuldades enfrentadas ao chegarem e a vontade de permanecer na cidade.

Sonho venezuelano

A venezuelana Estefany Graterol tinha 17 anos e havia concluído o Ensino Médio quando saiu de Los Teques, cidade localizada no Estado de Miranda, na Venezuela. Ela veio para Manaus em 2016, três anos após o início da crise econômica e política que abalou o País vizinho.

O seu irmão mais velho, na época com 23 anos, foi o primeiro a sair de casa, como mochileiro, em busca de um novo lugar para a família. Na capital amazonense, ele conseguiu um emprego e conseguiu recursos para trazer a mãe, e três irmãos.

Estefany e sua família em 2016, algumas semanas após chegarem em Manaus (Reprodução)

Estefany contou que os primeiros anos no Brasil foram difíceis, principalmente por não ter conhecidos além da família. “Entender o idioma também era complicado, mas graças a Deus eu conheci muitas pessoas que ajudaram a me adaptar”, disse a jovem, que atualmente fala e escreve português de forma fluente.

Quando morava na Venezuela, o seu maior sonho era que a família tivesse uma vida melhor. “E ainda continua sendo isso. Gostaria de terminar os meus estudos e ter uma boa profissão, ter um bom trabalho para ganhar bem, conseguir sustentar a minha mãe e ajudar a minha família, que continua morando lá”.

Atualmente Estefany Graterol tem 25 anos e trabalha como operadora de call center. Apesar de apontar a insegurança como parte negativa da capital amazonense, ela destaca que Manaus é uma “cidade diversa onde você pode encontrar diversos tipos de migrantes”.

Família de Estefany em 2023, após o nascimento de uma sobrinha, a primeira brasileira da família (Reprodução)

“Sejam pessoas de outros países ou de outros Estados, sinto que Manaus é terra de estrangeiros. Penso que os manauaras são muito gente boa, já que mostram sem problema algum a cultura e a comida. Sinceramente, eu amo Manaus. Eu considero o Brasil como O meu segundo País. Eu me sinto tranquila e feliz morando aqui. Claro que cada dia eu sinto muita saudade da minha família e meus amigos de lá [Venezuela], mas parte do meu coração pertence ao Brasil”, afirmou.

Ciência australiana

Um dos fatores de destaque que atrai estrangeiros para Manaus é a ciência e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), localizado no bairro Petrópolis, Zona Sul da capital, é um dos lugares na cidade que abriga uma diversidade de nacionalidades, sejam latinos, europeus, asiáticos, e até oceânicos, como é o caso de William Ernest Magnusson, ou “Dr. Bill” como é conhecido.

Em 1979, ele saiu de Sydney, capital da Austrália, e mudou para Manaus a convite do Inpa. Na época, o pesquisador tinha 27 anos, cursava doutorado em Ciências Biológicas da Universidade de Sydney e não falava o idioma português.

Dr. Bill em campo na Reserva Florestal Adolpho Ducke em 1987 (Reprodução)

À CENARIUM, o pesquisador falou sobre as dificuldades que encontrou ao chegar no Brasil, porque precisava adaptar-se à nova língua e costumes, além dos problemas sociais e e econômicos. O pesquisador mencionou a inflação descontrolada e a falta de estrutura da cidade. Atualmente, diz Dr. Bill, a preocupação é com o aumento da violência na capital amazonense.

“Problemas gerais de inflação de 1000% por ano no final do século XX e a falta de infraestrutura na cidade. Hoje estou bem, mas me preocupo com o aumento de violência em Manaus que não tinha nos primeiros anos. É muito descaracterizada em relação a Manaus dos anos 80”, afirmou.

Em 45 anos vivendo em Manaus, o pesquisador já participou de diversas pesquisas, publicou centenas de artigos, orientou vários estudantes de mestrado e doutorado, foi citado na lista dos 100 mil cientistas mais influentes do mundo. Dr. Bill também tornou-se membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e atualmente é coordenador do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio) no Inpa.

O pesquisador na Reserva Florestal Adolpho Ducke em 2023 (Reprodução)

Biodiversidade que ele classificou como “exuberante” e “a melhor parte de morar em Manaus”, sendo o seu maior interesse na região. “[Meu interesse] continua sendo de trabalhar com a biodiversidade, mas incluo mais o trabalho conjunto com as pessoas locais que enriquecem a minha vida e o meu trabalho”.

Música búlgara

A música é considerada uma linguagem universal, que também é falada de forma versátil em Manaus. E foi ela que trouxe a cidadã búlgara Elena Koynova a capital amazonense em 1999. Ela saiu da cidade de Plovdiv, no distrito homônimo, na Bulgária, para ser uma das violinistas da Orquestra Amazonas Filarmônica.

Na Bulgária, Elena era professora e intérprete de violino. Saiu de lá aos 34 anos, após passar na seleção da Filarmônica, que atualmente conta com 90 músicos, sendo 69 de variadas nacionalidades.

Em registro de 200, Elena Koynova ensina uma criança a tocar violino (Reprodução)

O marido de Koynova veio logo depois e os dois construíram história na capital amazonense. “Não foi fácil, mas não foi impossível”, comentou. Em 2010 ela adquiriu a cidadania brasileira e desde então fala que é manauara.

“Manaus é a minha cidade. O meu amor. A minha vida é concentrada em Manaus, principalmente os últimos anos. O meu trabalho, a minha família, os meus amigos. É o meu lar e eu não me imagino em outro lugar”, disse.

Ela destacou como "pior" e ao mesmo tempo "melhor" o fato de Manaus ficar localizada em uma região de difícil acesso por estar no meio da Amazônia. Para a professora, esse fator limita a capital, mas também ajuda a preservá-la. “O que na vida não tem duas coisas? A melhor coisa de Manaus são as pessoas. As pessoas são maravilhosas e eu amo as pessoas de Manaus”.

A professora e intérprete de violino em 2023 (Reprodução)

Desde que chegou à cidade, Koynova se dedica tanto à interpretação da música quanto ao ensino dela, já tendo levado o aprendizado a várias pessoas que buscam por essa forma de arte. Hoje, aos 59 anos, ela relata que quando era jovem e morava em seu país natal, não teve oportunidade de sonhar.

“Tive metas alcançáveis e metas inalcançáveis, como na vida de cada um. Mas nos últimos anos meus na Bulgária eu queria realmente era sair do País. Simplesmente eu não queria continuar morando lá, então foi um sonho realizado”, ressaltou. O maior sonho dela atualmente é “ter saúde para continuar vendo Manaus florescendo e se transformando”.

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Editado por Jadson Lima