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Na última quarta-feira (16) o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), recuou de mais uma decisão envolvendo a pasta da educação. A gestão pediu ao Ministério da Educação (MEC) para receber os materiais do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), vinculado ao governo federal.

A pasta da educação vem acumulando polêmicas nas últimas semanas. A volta ao programa do governo federal aconteceu depois da Justiça conceder uma liminar que suspendia a decisão da Secretaria da Educação de não aderir ao PNLD.

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A 4ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou a anulação do ato administrativo que retirou São Paulo do PNLD, após um pedido do Ministério Público de São Paulo (MP-SP).

O juiz atendeu a uma ação popular assinada por parlamentares do PSOL: os deputados Luciene Cavalcante (federal) e Carlos Gianazzi (estadual) e o vereador da capital paulista Celso Gianazzi.

O juiz apontou que o prazo para a escolha das obras do PNLD vai até o dia 23 de agosto. Segundo ele, a retirada do estado do PNLD, determinada pelo governo de Tarcísio de Freitas, “configura, em princípio e em tese, patente violação ao princípio constitucional da gestão democrática que deve pautar o sistema de educação pública” o que “exigiria, para a implementação de medidas como a ora em tela, profundo e amplo debate com representantes da comunidade acadêmica, dos estudantes, Conselhos Escolas, dentre outros agentes e gestores do sistema educacional do Estado de São Paulo”.

Na decisão, o secretário da Educação de SP, Renato Feder, afirmou que a pasta decidiu aderir ao programa "levando em conta o diálogo com a sociedade".

O outro ponto que gerou repercussão na pasta da educação também tem relação com livros didáticos. Tarcísio revelou no início do mês que as escolas estaduais receberiam, a partir do 6° ano do ensino fundamental, apenas o uso de material 100% digital, enquanto os livros físicos ficariam limitados aos anos escolares iniciais.

A medida também foi criticada por especialistas e professores. Após a polêmica, o governador voltou atrás e anunciou que o estado vai disponibilizar o material didático digital do Currículo Paulista de forma impressa e on-line, ficando a critério do aluno escolher.

Além da oferta de livros impressos e digitais, o governo paulista decidiu cancelar a compra de materiais digitais feita sem licitação com a empresa Bookwire. A decisão foi anunciada pela Secretaria da Educação na última quinta-feira (17).

O contrato forneceria 68 títulos para cerca de 2,9 milhões de estudantes da rede de ensino, totalizando aproximadamente 197 milhões de acessos. O custo total seria de R$ 15,2 milhões.

O site da TV Cultura conversou com Adriana Bauer, que é professora na Faculdade de Educação da USP, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e especialista em programas de avaliação de políticas, para falar sobre as últimas ações do governo paulista. Segundo ela, é necessário que a gestão tenha como prioridades a diminuição das desigualdades de aprendizado entre os diferentes grupos e medidas que recupere o que não foi ensinado no período da pandemia.

Livros digitais

De acordo com Adriana Bauer, a ação dos livros digitais, mesmo não sendo em sua totalidade, desconsidera as diferentes realidades do estado de São Paulo em relação à educação. A especialista cita, por exemplo, as áreas rurais do estado e do interior, que não possuem o mesmo alcance de internet da região metropolitana e da capital paulista.

“A tecnologia não chega nas escolas da mesma forma, tem ponto cego. Em alguns lugares chega o tablet, mas não chega à internet. E como vai ficar a manutenção dos aparelhos? Se quebrar [o tablet] o aluno fica sem livro? Fica sem acesso? Como que faz se a possibilidade de manutenção não é considerada? A gente está falando do município de São Paulo, um município rico. Tem escolas pequenas no interior, em áreas rurais, se o aparelho quebrar, a criança vai ficar sem acesso?”, aponta.

A especialista cita que a manutenção dos aparelhos pode ser um desafio, uma vez que a gestão não apontou como esse monitoramento vai ser realizado. Adriana Bauer explica que isso gera uma preocupação entre os professores, pois existe a chance dos alunos ficarem sem o material nas aulas em caso de algum problema nos aparelhos.

Não apenas problemas operacionais preocupam a professora. A maior questão envolvendo os livros digitais é a desigualdade. Adriana Bauer relembra que muitos estudantes possuem apenas o contato com o material didático em casa.

“O que pode acontecer é a gente acirrar as desigualdades de aprendizagem entre os alunos, aqueles que transitam melhor por esses meios digitais em um material tendo alguma qualidade talvez aprendam mais do que os demais que tem algumas dificuldades”, diz.

“Muitas vezes o único contato que algumas crianças têm é com um livro impresso. Uma parte importante da população não tem livros em casa e não tem acesso a essa cultura letrada. Às vezes, por meio da escola e do material didático, é o primeiro contato que essa criança vai ter para poder manipular o livro”, acrescenta.

A proposta, segundo a professora, também desconsidera os tipos de portadores textuais, visto que não somente os tablets podem oferecer essa tecnologia.

Prioridades na educação

O debate sobre livros e materiais digitais não pode ser deixado de lado pelo governo e pelas autoridades responsáveis. No entanto, a especialista reforça que outras prioridades precisam ganhar a atenção da secretaria de Educação.

A pandemia da Covid-19 impactou diretamente no aprendizado dos alunos do estado, muitos conteúdos não foram dados de forma presencial, o que atrasou o entendimento dos jovens sobre assuntos importantes da base curricular. Entre as medidas a serem tomadas, Adriana Bauer cita que o governo estadual e federal devem se debruçar em formas de equalizar o ensino entre os estudantes.

“A prioridade do Brasil é tomar medidas que possibilitem uma maior equidade entre os estudantes. As desigualdades entre estudantes de classe econômica mais privilegiada, de raça, cor e gênero são gritantes. A gente já sabia disso, mas eu acho que agora depois da pandemia, essas desigualdades ficaram escancaradas”, afirma.

Para Adriana, as políticas precisam propiciar um aprendizado efetivo aos alunos e recuperar aprendizagens que não foram realizadas no período da pandemia. Um dos caminhos é o mapeamento do que foi não ensinado durante os anos de 2020 e 2021 para a realização de um programa que compreenda as necessidades dos estudantes, principalmente nas áreas da alfabetização, letramento e numeração.

“Falta conhecimento sobre a complexidade dos problemas educacionais desta rede de ensino, ela é muito desigual e tem trajetórias muito distintas. Ela já tem um caminho de produção e me parece que isso tudo está sendo desconsiderado. Se a gente não considerar esse histórico e fazer uma análise desses resultados educacionais, dificilmente a gente faz uma política assertiva”, declara.

“Não é o material que vai recuperar tudo isso. São programas para adequação curricular, para definir as aprendizagens básicas e propor formas de recuperar as aprendizagens que não foram feitas no início da pandemia. Se a gente não olhar para isso, a gente só contribui para aumentar a desigualdade entre os alunos”, argumenta.

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