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Reprodução/Flickr Senado Federal
Reprodução/Flickr Senado Federal

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) tem sido um dos assuntos mais comentados nos últimos meses. O "reality show" da política brasileira tem chamado atenção até daqueles não familiarizados com o tema. Mas afinal, o que é e para que serve uma CPI?

De acordo com o Art. 58 parágrafo 3º da Constituição Federal, as comissões parlamentares de inquérito podem ser criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, com o objetivo de investigar um fato determinado, que será o objeto de toda ação, atuando em um prazo determinado.

As comissões acontecem no Poder Legislativo, cuja competência é também fiscalizar e controlar a administração pública, inclusive o Poder Executivo, comandado pelo presidente da República. Podem ocorrer não apenas no âmbito Federal, mas também Estadual e Municipal. Nesse caso, as Assembleias Legislativas dos estados e as Câmaras de Vereadores dos municípios têm a liberdade para instaurar uma CPI.

Para que sejam formadas as comissões, é necessária a assinatura de um terço dos parlamentares. Após a aprovação, seus membros são indicados pelos próprios partidos, obedecendo ao critério de proporcionalidade, ou seja, quanto mais cadeiras o partido tem na Câmara ou no Senado, mais membros terão na comissão.

O professor, doutor em direito e advogado criminalista, Fernando Hideo, conversou com o site da TV Cultura para desmistificar o tema. Segundo o professor, “a questão mais urgente é traduzir essa ritualização que fica distante do povo”.

De acordo com o advogado, a CPI “não é um fim em si mesmo”. É um meio de apuração e investigação, ou seja, não possui o poder de responsabilizar, nem de aplicar sanções, mas sim buscar pela “reconstrução histórica dos fatos”, através de convocação de depoimentos, testemunhas, acesso à documentos sigilosos e em atos mais extremos, quebra de sigilo bancário, fiscal e de dados.

CPI pode prender?


Uma dúvida bastante comum que circulou nas redes sociais com a CPI da Covid-19, é sobre o direito da comissão de decretar prisão. O assunto surgiu após o relator Renan Calheiros (MDB-AL) ameaçar o ex-secretário de Comunicação Fábio Wajngarten de prisão, alegando o crime de falso testemunho

"Se ele mentiu à revista 'Veja' e a esta comissão, eu vou requerer a Vossa Excelência na forma da legislação processual, a prisão do depoente", disse o relator da CPI na ocasião.

Sobre isso, Hideo explica que a Comissão Parlamentar de Inquérito “não possui poderes especiais para punir”. Isso porque, em uma situação de flagrância, “qualquer pessoa pode dar voz de prisão a alguém, e esta deve ser imediatamente comunicada à autoridade policial”. 

Leia também: Webstory: O que é e para que serve uma CPI?

No caso Wajngarten, o advogado criminalista ainda acrescenta que, uma prisão por falso testemunho durante uma CPI é mais um “ato simbólico" do que uma necessidade extrema, já que o delito não justifica uma prisão preventiva, e deve ser julgado em audiência, além de ser um crime afiançável. “A prisão como pena jamais pode ser imposta pela CPI”, explica Hideo.

Posso ficar calado na CPI?

Como mencionado, as comissões possuem o direito de investigar e convocar figuras para depor. Mas elas são obrigadas a falar? O caso envolvendo o depoimento do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, trouxe esta indagação.

Pazuello foi convocado para depor no dia 5 de maio, mas alegou ter tido contato, até então recente, com pessoas que haviam testado positivo para Covid-19. Sem se submeter ao teste, o ex-ministro sugeriu a manutenção da data, com depoimento virtual, ou adiamento, para cumprir a quarentena.

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que aguardaria para que a declaração ocorresse de maneira presencial. Uma nova data foi aprovada pelos integrantes da CPI. A oitiva ocorreu no dia 19 do mesmo mês.

Neste meio tempo, a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) para que concedesse ao ex-ministro o direito de ficar em silêncio. No requerimento, a AGU argumentou que perguntas poderiam levar Pazuello a produzir provas contra si mesmo. O ministro do STF, Ricardo Lewandowski, decidiu conceder ao ex-ministro o direito de ficar em silêncio.

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Hideo explica que a Constituição Federal assegura o direito ao silêncio e a não autoincriminação. Desta forma, investigados não poderiam ser obrigados a falar. Entretanto, no caso de uma testemunha, isso não se aplica, já que são obrigadas a falar. 

O art. 203 do Código de Processo Penal afirma que: “A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado”.

Para o advogado, a decisão de Lewandowski é de "difícil compreensão”, já que não foi decidido o papel de Pazuello durante o depoimento, logo, ficava a critério das perguntas o teor investigatório ou testemunhal.

CPI acaba em pizza?


Os destinos da CPI são bastante imprevisíveis. Finalizadas as oitivas e o recolhimento dos documentos julgados necessários, é produzido um relatório final que possui caminhos variados. 

O primeiro, de acordo com o especialista, é de responsabilização criminal. “Caso indicado prática de crime e sua autoria, são encaminhados ao Ministério Público Federal, neste caso”, explica Hideo, lembrando que a CPI pode ocorrer nos três níveis. 

O outro caminho, é de consequências administrativas e impeachment. E ainda, caso concluída a necessidade de edição de uma lei, o relatório é encaminhado à mesa diretora da Casa Legislativa.

A importância de uma CPI

Embora tenha destinos jurídicos, a CPI também age devido a sua reverberação e seu alcance. Na maioria das vezes, o tema estará presente em noticiários diariamente, o que traz grande exposição ao fato determinado, podendo alterar até mesmo os rumos políticos do país. Este é o motivo pelo qual essas investigações ficam sob responsabilidade do Poder Legislativo, e não órgãos policiais, por exemplo. 

“Por razões históricas, temas que tem sensibilidade política possibilitam esse tipo de apuração. O legislativo cria leis e as fiscaliza, aí que se insere essa possibilidade. Temas mais sensíveis, é mais uma questão política do que jurídica”, afirma Fernando Hideo, que ainda acrescenta a importância do cuidado para que o trabalho não seja desmoralizado. 

“Muito palanque desmoraliza o trabalho e o torna inefetivo. Discurso para a audiência é um impasse para o trabalho”, comenta o advogado a respeito dos longos discursos que antecedem as perguntas dos senadores.

CPIs de destaque

O site da TV Cultura separou três Comissões Parlamentares de Inquérito que mudaram os rumos políticos do Brasil.

CPI do caso PC Farias

Responsável pela destituição do então presidente Fernando Collor, a comissão investigou o pagamento de propinas em troca de favores do governo.


CPI dos Medicamentos

Foi criada para investigar reajustes excessivos nos preços de medicamentos, além da falsificação de remédios.


CPI do Mensalão

Com o objetivo de investigar o pagamento mensal de propina a deputados em troca de apoio ao governo, a CPI do Mensalão causou grande crise no governo Lula.